quinta-feira, 3 de maio de 2012


Computador na escola: a solução dos problemas da educação brasileira?
  
Computador na escola! - até bem pouco tempo, um "privilégio" quase que exclusivo das escolas particulares. Com o Programa Nacional de Informática na Educação, em implementação pelo MEC e pelas Secretarias de Estado de Educação, esse "privilégio" passa a ser também de muitas escolas públicas brasileiras. Comunidades escolares de todos os lugares do Brasil movimentam-se no sentido de conseguir um laboratório de computadores e colocar seus alunos em contato com a tecnologia. Entretanto, a maioria dessas comunidades não tem clareza dos motivos que provocaram essa corrida em busca da tecnologia, nem dos mitos, concepções e ideologias que perpassam a introdução do computador na escola.
Para que a introdução dessa tecnologia não se transforme em mais uma panacéia, como tantas outras experiências vivenciadas na tentativa de resolver os problemas da educação brasileira, torna-se necessário refletir, discutir e entender todas as implicações da introdução dessa inovação no processo pedagógico. Um dos fatores que se faz necessário discutir é o motivo que provocou a introdução do computador na escola.
Com a implementação no Brasil, como na maioria dos países do mundo, de um novo modelo econômico, ocorreu uma mudança em todos os setores da sociedade –economia, política, relações de trabalho, valores. Para o país poder adequar-se a esse novo modelo e concorrer de igual para igual com os países desenvolvidos no mercado internacional é fundamental empregar os avanços científicos e tecnológicos no processo de desenvolvimento econômico. Para tanto, é necessário preparar a população para fazer uso da tecnologia de ponta, ao mesmo tempo em que a mesma é disseminada pelo país. As políticas públicas passam a direcionar-se para a modernização de todos os setores da sociedade, investindo-se maciçamente em tecnologia, buscando atingir estágios superiores de desenvolvimento das forças produtivas e da organização política e social.
Estrategicamente, o computador e a Internet começam a aparecer na mídia, passando a ser um fenômeno popular; todos querem ter acesso a essa tecnologia – inclusive as comunidades escolares -, embora muito poucos consigam. A falta de condições econômicas e a resistência à tecnologia, apresentada pela maioria da população economicamente ativa, dificulta essa inserção.
Torna-se necessário então investir na parcela da população que não apresenta essa resistência – os jovens. Mas como atingir a juventude, se a maioria da população não apresenta condições econômicas que possibilite o acesso à tecnologia? Obviamente, só tem um caminho – a escola. Na escola, com um laboratório de 15 microcomputadores e uma linha telefônica é possível atingir uma população de mais de 500 alunos.
Entretanto, da forma como tais inovações estão entrando na escola, mesmo que sob a égide do discurso da melhoria da qualidade da educação, torna-se difícil atingir os objetivos esperados, pois não basta a presença das máquinas para que todos os problemas, quer econômicos, sociais ou educacionais do país sejam resolvidos - o progresso técnico, por sua natureza instrumental, não implica necessariamente em modernização mais ampla da sociedade, em seus aspectos político, social e cultural.
O computador tem chegado à escola, na maioria dos casos, sem o respaldo de uma proposta pedagógica gerada a partir de um estudo sistemático da comunidade escolar envolvida; a maioria dos projetos envolvendo Educação e Informática desenvolvidos pelas escolas são elaborados por grupos externos a elas, o que sujeita os poucos professores que se envolvem nesses projetos ao papel de mero discípulos, receptores de conhecimentos alheios e os torna alienados das reais necessidades e interesses de sua comunidade; a tecnologia, via de regra, é incorporada ao modelo tradicional de educação, servindo para auxiliar e reforçar a lógica desse modelo - classificar, selecionar e excluir os "menos aptos"; as direções das escolas usam a tecnologia como marketing, como forma de atrair maior número de alunos; e os demais professores, os que deveriam ser os principais responsáveis pelo uso desses recursos em sala de aula, não sabem como lidar com eles nem como usá-los em suas aulas, o que mantém a grande maioria dos professores das escolas à margem do processo; também não lhes são fornecidas condições de tempo e estudo para inserir-se no processo.
A comunidade escolar ainda não percebeu que a Informática na escola, sem o devido embasamento teórico-metodológico, é uma forma de selecionar os mais aptos e marginalizar a grande maioria, inclusive os professores. Isto porque somente aqueles que já são dinâmicos e autônomos conseguem se adaptar à inovação sem uma proposta pedagógica que lhe dê sustentação. Também não percebeu que, embora a introdução das inovações tecnológicas na escola busque formar uma cultura informática, onde todos tenham acesso às inovações, sejam impregnados pelos ideais de modernidade e preparem-se para o mercado de trabalho, esse modelo econômico comporta apenas uma pequena parcela da população, ou seja, persistindo o modelo econômico atual, ter "domínio" - primeiras noções técnicas fornecidas pela escola - das inovações não garante a inclusão no processo produtivo.
Por outro lado, a introdução das Novas Tecnologias da Comunicação na escola pode significar uma possibilidade de transformar o processo de cópia, transmissão e imposição de conhecimentos prontos, próprios do modelo tradicional de educação, num processo dinâmico de estruturação, potencialização e fortalecimento de novas idéias; idéias que podem transformar a escola num espaço vivo de produção, recepção e socialização de conhecimentos. O computador e as redes de computadores na escola oportunizam que tanto alunos quanto professores percebam que a verdade e a universalidade próprias do modelo tradicional não são mais questões fundamentais; com a informática pode-se perceber que as informações veiculadas são sempre transitórias, perecíveis e refletem o estado atual de uma determinada situação; o conhecimento não é mais estático, encontra-se em metamorfose permanente.
Para que essa possibilidade se efetive e possa-se atingir a tão falada "qualidade da educação" é imprescindível que todos os membros da comunidade escolar, em especial os professores, sejam envolvidos no processo e na discussão sobre os objetivos e as possibilidades da introdução do computador e das redes de computadores na escola, revisando e renovando conteúdos e procedimentos, de forma que uma nova lógica possa instaurar-se na escola.

Essa reportagem foi escrita em 1998. 14 anos depois parece bem atual, não?

Maria Helena Silveira Bonilla
 Jornal da Manhã, Ijuí - RS, 12 fev. 1998, caderno especial de Informática, p.2.

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